Nada a fazer
Por detrás das copas
Some a luz
Dia após outro
E nada podemos fazer
Se vem frio ou choro
Desconforto de papelão
Eco do ronco das tripas
Sem recheio, ocas
Se falta abraço e sobra vazio
Nada podemos fazer no escuro dos becos
Na sombras estáticas
Sob o lusco-fusco vermelhos das lanternas
Se não há teto nem estrelas
Se há sereno e chuvisco
Se água desce levando a cama
E os bueiros se enchem de pobreza
Nada podemos fazer
Se fecharam as escolas e inauguraram cadeias
Se derrubaram o cinema e abrigaram uma seita
Se arrancaram o sorriso com o último dente
Se esconderam as manhãs na penumbra dos prédios
Nada há de ser feito
Se o arroz foi trocado por cola
E a cola engana a fome teimosa
E a pedra já não é só fuga, é hábito
Se cada sentimento é camuflado
Na dureza dos vincos precoces
E a pele resseca e quebra na velhice adolescente
Não há nada a ser feito.
Se a família foi trocada pelos iguais
E as paredes que cercam tem grades
Ou são as laterais do buraco raso
E a visão não segue mais que alguns passos
Até a cortina que esconde o futuro
Nada podemos fazer
Se livros nunca houveram
Nem brinquedos, papel e tesoura
Festa colorida de balões e risadas
Sonhos regados e adubados logo cedo
Afago e ensinamentos úteis além de um dia
Nada fizemos
A noite cai e nada podemos fazer. Seu poema arrasta-me nada posso fazer.
Você fez!
Sua poesia é antagônica.
Porque preenche e esvazia concomitantemente, contrariando as leis da física, onde um corpo não ocupa o espaço de outro,ao mesmo tempo...
Dilacera os sentidos, pois esboça em uma unica tela, a iniquidade e abundância, paradoxamente alojadas num mesmo "set"...
São tantas mazelas, tantas favelas, tantas banguelas...
São tantos "bistrôs", tantos "arsnovôs", tantos arlequins e "pierrôs"...
Já não ha mangas a arregaçar diante deste arregaço...
Nada a fazer, alem de tudo por fazer...
e o tempo se esvai...e a velhice precoce chega com o cansaço...